Integração com lavoura quintuplica lotação animal após recuperar pastos

Após dois anos de cultivo de capim, seguidos de dois anos de soja, em pastos que antes estavam degradados, foi possível elevar no primeiro pastejo as taxas médias de lotação de uma para até cinco unidades-animal (UA) por hectare. 

O resultado foi observado em solos arenosos do oeste paulista, nos municípios de Presidente Prudente, Presidente Wenceslau e do Oeste do Paraná, região do arenito de Maringá. A UA corresponde a um animal de 450 quilos de peso vivo. 

Os dados foram registrados pelo pesquisador da Embrapa Cerrados João Kluthcouski. "São solos considerados difíceis, mas que com o uso da tecnologia se tornam fáceis [de manejar]", declara.

As pesquisas mostram que a soja tem se apresentado como uma alternativa viável para lidar com solos arenosos e em estado de degradação. A recuperação se dá por meio da integração lavoura-pecuária (ILP). 

Há ganhos tanto em produtividade, quanto no uso e conservação do solo. De acordo com os dados obtidos nas pesquisas de Kluthcouski, as pastagens degradadas são recuperadas, permitindo a engorda dos rebanhos a um custo de produção da arroba entre R$ 35 e R$ 50, bem inferior ao praticado pela pecuária tradicional, entre R$ 70 e R$ 100.  

A técnica consiste em alternar espécies vegetais, numa mesma área, conservando o solo e diminuindo sua exaustão. "Podemos dizer que a pastagem beneficia a soja e a soja beneficia a pastagem, em rotação", diz o pesquisador da Embrapa Soja (PR) Alvadi Antonio Balbinot. Ele explica que a soja fixa nitrogênio (N) no solo e se torna uma combinação perfeita com pastagem, formada por gramínea que não retém esse elemento. A fixação biológica de nitrogênio (FBN) economiza a aplicação desse macronutriente no solo.

Balbinot defende a soja como alternativa de cultura economicamente interessante ao pecuarista. "Produzir soja significa gerar proteína e garantir a produção de frango, suínos, leite e outros produtos animais, sem esquecer do óleo. O mercado para os grãos da oleaginosa é garantido", afirma.

Panorama da degradação
Atualmente, mais da metade das pastagens localizadas no Cerrado brasileiro encontram-se em algum estágio de degradação, segundo dados da Embrapa Monitoramento por Satélite (SP). 

São 32 milhões de hectares em que a qualidade do pasto está abaixo do esperado, no cenário mais realista, comprometendo a produtividade e gerando prejuízos econômicos e ambientais. 

Boa parte desses solos é arenoso e poderia ser recuperada, possibilitando  até triplicar a produção de carne nessas áreas ou contribuir para a expansão da agricultura, além de reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

"São milhares de famílias vivendo sem perspectivas nessas áreas. A adoção da ILP permitiria quase dobrar a área de produção de lavouras anuais de grãos, que hoje é de 55 milhões de hectares", observa Kluthcouski.

Se adotada e conduzida de modo adequado e por um período suficientemente longo, o cultivo de soja, por meio de rotação de culturas, incluindo pastagens, apresenta inúmeras vantagens ao pecuarista: produção diversificada de alimentos e outros produtos agrícolas, melhoria das características físicas, químicas e biológicas do solo; auxílio no controle de plantas daninhas, doenças e pragas; reposição de matéria orgânica e proteção do solo  contra a ação dos agentes climáticos.

O plantio de braquiária costuma quebrar o ciclo de doenças e pragas que atacam a soja. "Porém, é bom lembrar também que soja não substitui a pastagem. Ela entra nas propriedades como uma boa alternativa rentável", ressalta o pesquisador da Embrapa Soja Balbinot.

Algumas iniciativas desenvolvidas pela Embrapa, em parceria com outras instituições, nos estados do Paraná, Mato Grosso do Sul, Oeste Paulista e Oeste Bahiano, revelam que por meio do ILP a recuperação de pastagens é viável e apresenta resultados financeiros positivos com o passar dos anos.

Curiosamente, um dos maiores obstáculos para a adoção da ILP é o costume arraigado da monocultura no cenário nacional. "[A ILP] demanda o desenvolvimento de novas habilidades por parte dos pecuaristas e dos agricultores, incentivando uma saudável troca de experiências e o fortalecimento de parcerias em favor do aumento da produtividade do campo, porém, isso envolve a quebra de paradigmas", analisa o pesquisador Guilherme Lafourcade Asmus, chefe-geral da Embrapa Agropecuária Oeste (MS).

Para o secretário de Produção e Agricultura Familiar do Governo de Mato Grosso do Sul, Fernando Lamas, a Integração Lavoura-Pecuária é uma das soluções, dentro do Plano ABC do governo federal, para ocupar de forma produtiva os nove milhões de hectares de pastagens degradadas existentes em Mato Grosso do Sul. 

"É uma tecnologia acessível, que pode ser adotada pelos grandes e médios pecuaristas de gado de corte e pelos pequenos produtores de gado de leite e que traz grandes benefícios para toda a sociedade", afirma Lamas.

Sistema São Mateus
A região da Costa Leste de Mato Grosso do Sul, também conhecida como Bolsão-Sul-Mato-Grossense, possui solo arenoso e chuvas distribuídas durante o ano de forma irregular. Há muitos anos, acreditava-se que, por esses motivos, seria impossível implantar a agricultura, especialmente o cultivo de soja, na região.

Mas, depois de oito anos de trabalho com soja, pastagem e pecuária, profissionais da Embrapa e da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), obtiveram resultados impressionantes. A média produtiva de carne subiu de seis para 20 arrobas por hectare e ainda foram obtidas 50 sacas de soja por hectare, em média, no mesmo sistema.

Isso significa que a prática da ILP viabiliza a agricultura na região, sem abandonar a pecuária. O sistema utilizado no Mato Grosso do Sul é o São Mateus (SSMateus). A diferença dessa tecnologia, validada pela Embrapa Agropecuária Oeste (MS) e Embrapa Gado de Corte (MS), é a correção química e física do solo antes de implantar a lavoura, além da formação de palhada para o plantio direto da soja. 

"Após a colheita, a área é usada como pasto por dois anos, depois a soja retorna e assim vão se alternando", explica o pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Júlio Cesar Salton.

Fonte: Embrapa
Foto: Silvia Zoche Borges/Embrapa