Biscoitos e cosméticos dos resíduos do maracujá

Resultado de parceria público-privado, a indústria Extrair Óleos Naturais utiliza as sementes de maracujá, provenientes de resíduos de indústrias de sucos e polpas do Norte Fluminense, para extração de óleo de alta qualidade. 

Recentemente, a indústria recebeu o Prêmio CREA-RJ de Meio Ambiente 2014, em reconhecimento pelo trabalho ligado à sustentabilidade da cadeia produtiva do maracujá no Rio de Janeiro. 

Também aprovou mais um projeto de inovação junto à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) para ampliação e automatização de sua linha de produção, visando o aproveitamento de outro resíduo: o farelo derivado da prensagem da semente, resultante da extração do óleo. 

Esse farelo desengordurado possui alto valor nutricional, podendo ser utilizado na fabricação de pães, biscoitos, sorvetes, caldas e recheios na indústria alimentícia. 

Como cerca de 70% do maracujá é composto por casca e semente, estima-se que a indústria fluminense possa gerar um desperdício e um impacto ambiental de cerca de 40 mil toneladas por ano, caso esses resíduos não sejam aproveitados. 

Inaugurada em 2010, no município de Bom Jesus do Itabapoana (RJ), na divisa com o Espírito Santo, a indústria Extrair já foi agraciada com vários prêmios de renome nacional e internacional, além de ser considerada em 2013, pela Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei) e pelo Instituto Ethos, um caso de sucesso. 

O desenvolvimento de coprodutos de alto valor agregado - como o óleo e o farelo de maracujá para a indústria alimentícia, cosmética e farmacêutica – pode gerar retorno financeiro maior que a comercialização do suco da fruta, com o benefício adicional da eliminação do passivo ambiental. 

"Já exportamos para os Estados Unidos, Inglaterra e agora vamos começar a atender uma das maiores indústrias alimentícias do Japão", conta o empresário Sandro Reis, da empresa Extrair.

A torta gerada no processo de extração do óleo é rica em fibras e proteína, e já está sendo incorporada em rações animais e na fabricação de sabonetes. Essa torta, bem como a própria semente, quando beneficiada, também pode ser utilizada no preparo de sorvetes, mousses, entre outros produtos alimentícios. É o que se propõe com o projeto de expansão da indústria, que deve ser concluído em 2015. 

O processamento do maracujá também gera outro subproduto: a casca, que é rica em fibras e pectina. Uma equipe da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf) pesquisa formas de beneficiamento da casca da fruta para obtenção de uma farinha nutritiva e funcional para consumo humano.

Reduzindo passivo ambiental
O Polo de Fruticultura Irrigada das regiões do Norte e Noroeste Fluminense apresenta um grande potencial de geração de empregos e renda para pequenos e médios produtores de frutas tropicais como abacaxi, maracujá, goiaba e coco. 

Nessas localidades também estão instaladas nove pequenas e médias agroindústrias que realizam o processamento da polpa para a produção de sucos com descarte da casca e da semente, gerando um passivo ambiental de cerca de 40 mil toneladas por ano.  

Um projeto desenvolvido pela Embrapa Agroindústria de Alimentos, no Rio de Janeiro, em conjunto com a Pesagro-Rio, a Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf) e o Instituto Federal-Campus Bom Jesus do Itabapoana, entre outros parceiros, busca alternativas para o desenvolvimento econômico, social e ambiental da cadeia produtiva do maracujá no Estado do Rio de Janeiro, com incorporação de tecnologias para o aumento da produtividade, treinamento e capacitação de técnicos e produtores rurais, além da implementação de uma planta-piloto para reaproveitamento das sementes do maracujá: a indústria Extrair.

O projeto "Inovação Tecnológica para o Desenvolvimento Sustentável da Cadeia Produtiva do Maracujá no Arranjo Produtivo Local" (APL Maracujá), financiado com recursos da Embrapa, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Faperj, e coordenado pela Embrapa Agroindústria de Alimentos, estabelece uma nova forma de atuação, em Arranjos Produtivos Locais, com visão integrada do campo-indústria no agronegócio para a sustentabilidade da cadeia produtiva do maracujá. 

- A estratégia é fazer inovação tecnológica, difundindo e transferindo as soluções tecnológicas ao maior número de produtores e de industriais das regiões envolvidas com a produção e processamento de maracujá, levando materiais genéticos com alto potencial produtivo, resistentes às principais pragas e doenças; além de estabelecer processos para o aproveitamento dos resíduos da indústria de suco e polpa do maracujá, na elaboração de coprodutos de alto valor agregado, acertando o compasso entre o campo, a indústria e o mercado - afirma Sergio Cenci, pesquisador da Embrapa e líder do projeto.

A fruticultura do Estado do Rio de Janeiro tem vantagens competitivas importantes como a proximidade da produção dos centros consumidores, infraestrutura adequada com logística e a presença de centros de pesquisa, além de um parque industrial com capacidade de triplicar, no mínimo, o volume de frutas a serem processadas. 

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil produz, anualmente, mais de 776 mil toneladas de maracujá de diversas variedades, cultivadas principalmente por agricultores familiares.  

- A cultura do maracujazeiro está entre as fruteiras tropicais mais plantadas no Brasil e é de grande importância social e econômica, por ser cultivada predominantemente por pequenos produtores e com boa rentabilidade econômica - afirma o pesquisador Fábio Faleiros, da Embrapa Cerrados, no Distrito Federal. O Estado do Rio de Janeiro é o segundo maior mercado consumidor do Brasil. 

Essa característica indica  oportunidades e um grande desafio para os agricultores fluminenses: produzir alimentos em volume e qualidade para atender a demanda. 

Mesmo com grande potencial produtivo para atender seu mercado consumidor da fruta in natura, o Estado do Rio de Janeiro ainda é abastecido por grandes quantidades de maracujá de outros estados do Brasil.

Desde 2007, o Projeto APL Maracujá vem desenvolvendo ações de pesquisa, transferência de tecnologia e inovação na região Norte Fluminense. Além dos esforços para recuperação da cultura do maracujá na região, um dos resultados importantes do projeto foi a criação da empresa Extrair Óleos Naturais, que tem trabalhado com o aproveitamento dos resíduos de indústrias de sucos e polpas de frutas. 

No último mês foi aprovada pela Faperj a fase II do projeto, com o objetivo de consolidar o Arranjo Produtivo Local do Maracujá, a partir da incorporação de novas variedades de maracujazeiro e fortalecimento das ações de extensão e de transferência de tecnologias. 

Atualmente, com a atuação da Embrapa e dos parceiros na região, percebe-se uma maior integração entre o campo e a indústria, entre as instituições de pesquisa e seus técnicos; além de um aumento, mesmo que lento e gradativo, da área plantada. 

Isto tudo vem contribuindo para a expansão da produção de maracujá no Estado do Rio de Janeiro.

O maracujá fluminense
O Estado do Rio de Janeiro, no ramo agropecuário, tem enfrentado inúmeros problemas  desde meados dos anos 1990, quando seu principal setor do agronegócio, a produção do açúcar e do álcool, por diferentes motivos, entrou em processo de decadência. 

Com apoio do programa Frutificar, lançado pelo governo estadual, no ano 2000, vários pequenos e médios produtores deram início ao  novo negócio de fruticultura, dentre eles o do maracujá. 

Em consequência, algumas indústrias instalaram–se na região para aproveitarem a oferta da matéria-prima, em especial, para a produção de suco. Em 2004, mais de 1.500 hectares de terras de maracujá abasteciam na quase totalidade as indústrias locais com matéria-prima. 

Em alguns municípios do norte e noroeste fluminense, o cultivo do maracujazeiro representava a principal atividade econômica.

No entanto, em 2007, a área plantada em ambas regiões do estado caiu para menos de 425 hectares, fornecendo somente uma produção de nove mil toneladas de matéria-prima, muito aquém do necessário para atender a demanda da agroindústria, confirmando um processo totalmente dissociado entre campo e indústria. 

Atualmente, a indústria de sucos e polpas do maracujá do Rio de Janeiro necessita de cerca de 2.100 hectares de área plantada e uma produção de 50 mil toneladas de frutas, operando com ociosidade e dependendo de matéria-prima de outros estados. 

A partir de 2007, uma força -tarefa envolvendo pesquisa e extensão, com mais de 40 técnicos de instituições como Embrapa, Uenf , Pesagro-Rio, Emater-Rio, Instituto Federal-Campus Bom Jesus do Itabapoana, Firjan, Superintendência de Agricultura do estado do Rio de Janeiro, programa Frutificar, Agroindústrias e Prefeituras Municipais, realizou diagnósticos que detectaram gargalos e desafios relacionados aos aspectos tecnológicos, no processo de produção e industrialização da matéria-prima e implantou melhorias no campo e na indústria visando a revitalizar a cultura do maracujazeiro na região Norte Fluminense. 

Atualmente, essa rede tem contribuído para o processo de consolidação do Arranjo Produtivo Local (APL) do Maracujá no Estado do Rio de Janeiro. "O maracujazeiro é uma cultura predominantemente de pequenos agricultores familiares, que demandam maior apoio técnico. É preciso continuar apoiando ações de transferência de conhecimento e tecnologias, para promover a melhoria e a expansão do processo de produção", conclui o pesquisador da Embrapa, Sergio Cenci. 

Fonte: Aline Bastos/Embrapa Agroindústria de Alimentos 
Fotos: Soraya Pereira/Embrapa