Especial: O que você precisa saber para cultivar abacaxi? Pesquisador da Unesp explica

Paulo Palma Beraldo

De Olho no Campo conversa hoje com o pesquisador Aloísio Costa Sampaio, da Faculdade de Ciências da Unesp de Bauru. Aloísio é professor do curso de pós-graduação em Horticultura da Unesp de Botucatu há mais de 10 anos. Ele é especialista em fruticultura, com destaque para abacaxi, maracujá, goiaba, abacate e figo.

O abacaxi, aliás, foi tema de várias de suas pesquisas e hoje Aloísio é uma das principais autoridades do Brasil no que diz respeito à fruta. Basta olhar o quadro pendurado na parede de sua sala no prédio do departamento de biologia da Unesp e perceber quanto o pesquisador gosta da fruta. 

A região de Bauru conta com um pequeno número de grandes propriedades produtoras de abacaxi. Uma delas, inclusive, cultiva abacaxi há mais de 50 anos. O perfil de Bauru é diferente de cidades como Guaraçaí, no noroeste paulista, onde está localizado o maior pólo produtor do estado, com mais de 200 produtores espalhados em pequenas, médias e grandes propriedades.


Brasil

No Brasil há predomínio significativo da produção de abacaxi da variedade Pérola, originária do Nordeste. As principais áreas produtoras estão no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em estados como Pará, Paraíba, Bahia e Tocantins.

Por ser nativo de Pernambuco, ele exige muito calor. Então, Sul e Sudeste optam por outras variedades, como o Hawaiano.

Já em âmbito global, nações como Tailândia e Filipinas são importantes produtoras da fruta, impulsionadas pela presença de multinacionais norte-americanas que processam o abacaxi. Na América Central, o destaque é a Costa Rica, que exporta o abacaxi da variedade Gold para diversos países. 
O Brasil tem grande produção voltada para o mercado interno. E há crescimento significativo na parte de processamento. Suco de abacaxi, por exemplo. Na Costa Rica, a produção é para o abastecimento do mercado europeu in natura. Filipinas e Tailândia, há a preferência para sucos e compotas - diz Aloísio. 

"O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de abacaxi"


Exemplo de 'sistema mineiro', comumente usado em Frutal-MG- Foto: Aloísio Sampaio
Grandes culturas estão em crescimento
Aloísio já viajou por vários estados brasileiros participando de congressos e simpósios sobre a cultura do abacaxi e percebe que, atualmente, o plantio de abacaxi está perdendo espaço em algumas regiões do estado de São Paulo.

É uma série de fatores, como a disponibilidade de área, já que houve um crescimento forte em arrendamentos para eucalipto, cana-de-açúcar e citricultura - explica. 

Aloísio enumera outros fatores, como a estabilidade do preço do abacaxi nos últimos cinco anos em contrapartida com o crescimento dos custos de produção, como fertilizantes, insumos, combustível e valor da diária dos trabalhadores. As condições climáticas também não tem sido favoráveis.


Durante o amadurecimento os frutos são envolvidos com jornal para evitar que sejam “queimados” pelo sol.  Foto: Aloísio Sampaio
Apesar de a cultura do abacaxi ser altamente resistente à seca, os últimos três anos, com secas prolongadas, fizeram com que houvesse uma queda de produção. A questão climática tem sido um empecilho para quem não tem irrigação - comenta. 

A escassez de mão de obra também preocupa, já que durante três períodos do ciclo do abacaxi, com duração entre 18 e 20 meses, é preciso contar com trabalho manual. 

O plantio das mudas, o ensacamento dos frutos e a colheita ainda não podem ser mecanizados. Nesses últimos anos houve um aquecimento muito grande da construção civil. Isso impactou a mão de obra no campo - continua.

Inovações
Durante os eventos que participa, Aloísio entra em contato com inovações na produção, como por exemplo técnicas de irrigação e práticas que possibilitam o aumento do número de plantas por hectare. 

- No último Simpósio de Abacaxi realizado em Tocantins, houve uma demonstração de campo do primeiro equipamento para plantio de mudas de abacaxi, possibilidade que não existia anteriormente - revela. 

Lembrança recebida em um dos eventos
sobre o cultivo de abacaxi.
Foto: Paulo Palma Beraldo/De Olho no Campo
Outros produtores estão aumentando a produtividade e utilizando todos os espaços disponíveis na propriedade, com a tecnologia conhecida como 'sistema mineiro'. 

-  Alguns produtores estão adotando máquinas com pneus finos e mais altos, fazendo com que sejam eliminados os carreadores, as áreas ociosas que ficam sem produção. São áreas menores, um hectare, dois hectares, em que é feita a colheita com um carrinho de mão. Chama-se sistema mineiro porque está muito presente em Frutal-MG - conta Aloísio.


A possibilidade de antecipação da colheita do abacaxi é tradicional, mas requer conhecimento do manejo cultural para decisão do momento a ser realizada a indução floral artificial. 

"Se a planta tiver um bom desempenho vegetativo existe a possibilidade  de antecipar a safra utilizando um hormônio sintético. Então, a planta paralisa seu crescimento vegetativo e inicia a fase reprodutiva, que é a inflorescência (fruta)".

O abacaxizeiro, para entrar em fase reprodutiva, precisa de dias com menos luz, característicos do inverno. 

- Esse período climático, de queda de temperatura e redução de luz no dia, faz com que a planta inicie sua fase reprodutiva, que culmina na colheita em dezembro, safra natural

Desafio da pesquisa:
Falta um produto que consiga inibir esse processo natural com eficiência e sem efeitos fitotóxicos, em teste por pesquisadores e empresas da área. 

Nosso desafio é atrasar a safra para fevereiro e março, períodos de difícil oferta regular de frutos da cultivar Smooth Cayenne. 


Uso de filme plástico é alternativa economicamente viável para regiões com pouca disponibilidade hídrica. O filme propicia boa retenção de umidade no solo e controla o crescimento de plantas daninhas.
Foto: Aloísio Sampaio
De Olho no Campo explica: 
Agora, um jogo rápido com vários dados sobre a produção de abacaxi. Em um hectare cabem 35.000 plantas, que produzem um fruto cada. O espaçamento é feito em linhas duplas, localizadas meio metro uma da outra. Na linha, cada muda é distante uma da outra em 30 centímetros. O terreno mais adequado para o plantio é o tipo arenoso ou areno-argiloso. 

O preço médio do kg da fruta é de R$ 0,90, sendo que nos meses de fevereiro e março/2014 chegaram ao patamar de R$ 1,50/kg.  Se as frutas forem comercializadas nesse preço a rentabilidade de um hectare atingirá aproximadamente R$ 50.000, contra investimento inicial próximo de R$ 20.000. Nunca existirá uma safra com 100% de aproveitamento nessa cultura. Problemas com frutas pequenas, pragas e doenças fazem parte. Uma perda total de 15% é algo bem razoável.

Cada abacaxi pesa aproximadamente 1,8kg. Os maiores gastos são com herbicidas, fertilizantes, mudas e mão de obra. 

- A muda é um investimento inicial bastante alto para os produtores iniciantes. Depois que você colhe essa fruta, você tem praticamente o dobro de mudas. Se eu plantei 35 mil, eu vou ter aproximadamente 70 mil mudas para o próximo plantio - garante. 

As mudas devem ser classificadas de acordo com seu tamanho e tipo. Dependendo do porte, algumas produzem mais cedo e outras têm ciclo mais tardio. Se não for feita a classificação, pode haver irregularidades. É mais interessante plantar áreas menores, mas em anos contínuos.

- É preferível plantar cinco hectares em 2014 e cinco hectares em 2015, porque a partir de 2016 você passa a ter uma safra por ano e mudas todos os anos. É melhor do que plantar 10 hectares em um ano e não ter plantio no outro. A partir de 15 a 18 meses, você passa a ter renda e mudas próprias todo o ano - aconselha. 

Mais informações sobre o cultivo de abacaxi podem ser encontrados no site da Embrapa ou entrando em contato com o professor Aloísio (aloisio@fc.unesp.br).

O De Olho no Campo agradece pela atenção de Aloísio Sampaio e pelas fotos tiradas pelo pesquisador.