Especial: Entrevista exclusiva com Carolina Wippich Andrade, engenheira agrônoma da ESALQ

Paulo Palma Beraldo

O De Olho no Campo fala hoje com Ana Carolina Wippich Andrade, engenheira agrônoma da ESALQ-USP, de Piracicaba. 

Ana Carolina Andrade realizou um trabalho abordando as diferenças entre o cultivo convencional e o cultivo orgânico do morango. Ela afirma que é importante pesquisar temas como esse para identificar as melhores maneiras de conservar e aumentar a vida de prateleira dos produtos, diminuindo o desperdício. 

Você sabia que um terço de todos os alimentos produzidos do Brasil são desperdiçados? Um número assombroso, que envolve todas as pessoas. Desde problemas durante a colheita, deficiências de infraestrutura e transporte até má distribuição e atitudes negligentes por parte dos consumidores.

- Diante desse cenário, há a necessidade de desvendar essas questões relacionadas tanto a qualidade pós-colheita quanto às diferenças entre orgânicos e convencionais - diz a pesquisadora.

No Brasil, o cultivo do morango é mais desenvolvido nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. No extremo sul de MG, cidades como Pouso Alegre e Estiva concentram importante parte da produção. Há grandes chances de você já ter consumido algum morango vindo dessa região. 

O projeto comparou a qualidade de morangos produzidos no sistema de cultivo orgânico e no sistema convencional provenientes de sete colheitas em diferentes cidades e épocas. 

- Os produtores de morango, tanto orgânicos quanto convencionais, tiveram papel fundamental para o desenvolvimento da pesquisa. Eles disponibilizaram suas propriedades e mão de obra para auxílio nas colheitas e compartilharam suas experiências e expectativas para o setor, o que foi fundamental para reproduzir na pesquisa, o que ocorre na realidade, no cotidiano - relata Carolina.

A conversa completa você confere abaixo.

De Olho no Campo: Em quanto tempo foi realizada a pesquisa?
Carolina Wippich Andrade: As coletas que deram origem aos resultados foram realizadas entre julho de 2012 a Janeiro de 2013. O trabalho foi realizado de março de 2011 a junho de 2013.

Você pretende continuar atuando nesta linha de pesquisa? Existe algum projeto em andamento?
Neste momento, estou trabalhando em outra área, porém esta linha de pesquisa ainda necessita de muitas investigações, bem como de inovações no setor para redução desse enorme desperdício não só de alimentos, mas como também de recursos naturais, recursos humanos, econômicos etc. 


Durante a pesquisa você teve contato com produtores orgânicos e convencionais. Quais as principais semelhanças e diferenças entre eles?

Ambos são muito conscientes das necessidades que a produção de morango apresenta por se tratar de um produto muito sensível ao ataque de pragas, doenças e impactos mecânicos desde a sua produção até a sua comercialização. 

Desta forma, para produzi-los sem o uso de agroquímicos, os produtores orgânicos precisam buscar alternativas inteligentes e viáveis para garantir uma boa produção do morango, um monitoramento da lavoura muito minucioso, adaptação das técnicas de cultivo, como o uso de controle biológico ao invés do químico etc. 

E para garantir uma produção orgânica certificada, necessitam seguir normas para que seus produtos sejam classificados como tal. Entre essas normas, também entram cuidados pós-colheita que devem ser obrigatoriamente tomados.

Quais as maiores dificuldades enfrentadas pelos dois tipos de produtores rurais? E o que eles fazem para contorná-las?
Acredito que as maiores dificuldades encontradas pelos produtores são com relação à sensibilidade dos frutos. Assim, ambos necessitam fazer um monitoramento rigoroso das plantações e tomar medidas integradas para minimizar as perdas. 

Um exemplo é a ação de retirada das folhas velhas da lavoura, ou frutos doentes que restaram de floradas anteriores, para que não ocorra a disseminação de patógenos pela lavoura afetando a sua produção e qualidade dos frutos.



"Além da redução dos desperdícios, é necessário garantir o fornecimento de alimentos seguros e de qualidade à população"

A pesquisa constatou que morangos produzidos no sistema orgânico possuem maior teor de sólidos solúveis e maior firmeza de polpa que aqueles produzidos no sistema convencional. Por que isso acontece?
Uma das possíveis explicações que se pode mencionar seria o uso de fertilizantes. 
Na agricultura orgânica, utiliza-se muito esterco curtido, dessa forma, a disponibilização dos nutrientes ocorre de maneira lenta e gradual, diferentemente da fertilização química na qual o fertilizante se torna prontamente disponível para a planta, o que pode ocasionar em desequilíbrio nutricional. 

Por exemplo, existem resultados que afirmam que o excesso de nitrogênio pode resultar em frutos com firmeza reduzida bem como menor teor de sólidos solúveis nos frutos.

O morango sofre bastante com o ataque de pragas e doenças durante seu cultivo comercial, o que faz com que seja necessário usar produtos químicos para produzi-lo. Existe uma forma de driblar esse uso sem prejuízos para os produtores nem para o meio ambiente?

O uso de produtos químicos registrados para a cultura do morango é uma opção de cultivo que se utilizada de maneira consciente, proporciona pequeno impacto tanto ao meio ambiente quanto ao consumo humano e trabalhadores rurais, como por exemplo, ocorre na Produção Integrada do Morango (PIMo) onde são seguidas normas e diretrizes para uma produção consciente de alimentos. 

Porém, a agricultura orgânica tem base em outros conceitos onde não é permitido o uso de fertilizantes sintéticos e controle químico.


Assim, são utilizadas alternativas como o controle biológico, manejo adequado do solo de forma que se mantenha a microbiota adequada e em equilíbrio com a produção de alimentos, fertilização com resíduos, como cinzas, utilização de “quebra-ventos” para auxiliar no controle de pragas, uso de diferentes plantas nas entrelinhas para proporcionar maior diversidade no ambiente, entre outras. 

Que cuidados especiais os produtores e consumidores devem tomar para que o morango “dure” mais tempo e estrague menos durante o armazenamento?
Os morangos devem ser armazenados sem a remoção do cálice (folhinha verde) e refrigerados. O morango apresenta alta taxa respiratória após a sua colheita, o que significa uma deterioração mais acelerada. 

Além disso, não possui uma “casca” que ajuda na proteção contra o ataque de microrganismos, contra a transpiração e choques mecânicos. Dessa forma, a sua conservação se dá melhor, quando refrigerado.


O De Olho no Campo agradece pela entrevista de Carolina Wippich Andrade.

Fotografia 1: Jens Wolf/AFP/Getty Images
Fotografia 2 e 3 - Viviane Fialho/Embrapa